Guardiões da natureza
Histórias de agricultores que criaram voluntariamente em suas propriedades uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)
Lívia Andrade
De carona nas recentes discussões sobre o novo Código Florestal, cuja votação na Câmara dos Deputados ficou para março de 2012, o Sou Agro levantou casos de produtores rurais que fazem mais no tocante à proteção ambiental do que a lei em vigor exige. São histórias como a da família Righetti, que destinou 10,55 hectares de sua propriedade de 29 hectares, que fica na parte capixaba da Serra do Caparaó, para criar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). Mas afinal, o que é uma RPPN?
Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), RPPN é “uma unidade de conservação criada em área privada, gravada em caráter de perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica”. Ela é fruto de uma decisão do proprietário, que por um ato voluntário decide destinar sua propriedade, ou parte dela, para RPPN, sem que isto ocasione perda do direito de propriedade.
A RPPN pode ser municipal, estadual ou federal. Antes de constituí-la é preciso providenciar uma série de documentos e fazer o georreferenciamento da área. Quando tudo estiver pronto, o órgão responsável emite o termo de compromisso que precisa ser averbado em cartório. Depois da constituição da RPPN, o proprietário tem o prazo de cinco anos para fazer o plano de manejo, que engloba o diagnóstico socioambiental da área, o mapeamento biológico de fauna e flora, bem como o zoneamento com as atividades em potencial de cada parte e a frequência com que vão ocorrer.
No caso do casal Angela e Severino Righetti – produtores de café, feijão, milho e fibras vegetais no município de Divino São Lourenço, no Espírito Santo, a ideia de criar uma RPPN surgiu por intermédio da filha Emanuelle, quando ela cursava a pós-graduação em educação e gestão ambiental e soube do edital do Programa de Incentivo às RPPNS da Mata Atlântica. “Elaboramos nosso projeto, nos inscrevemos e fomos selecionados”, conta Angela.
O programa envolve três ONGs, Mata Atlântica, Conservação Internacional e The Nature Conservancy (TNC), e disponibiliza recursos para as três fases do processo: documentação, elaboração e implementação do plano de manejo. Para a primeira etapa, a verba é de R$ 10 mil, e para a segunda e a terceira, o montante é de R$ 30 mil cada. “Há casos em que os proprietários pagam todas as despesas; em outros, eles precisam complementar”, diz Mariana Machado, coordenadora do Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica.
Com o recurso, a família Righetti criou a RPPN Cachoeira Alta, que recebeu este nome por causa da queda d’água cênica que tem no local. Atualmente, as principais atividades da RPPN são o “agroturismo”, por meio da Pousada Encanto da Serra, e as luminárias, álbuns fotográficos e porta-retratos artesanais feitos com papel de fibras cultivadas na propriedade: taboa, bananeira, agave. “Parte do valor arrecadado, reinvestimos na reserva, na sua manutenção e na criação de trilhas”, explica Angela.
Hoje, o Brasil tem mais de 1060 RPPNs constituídas. “Têm muitas com perfil conservacionista, que o avô já não deixava tirar madeira da área, e agricultores que veem a RPPN como uma forma de agregar valor à atividade produtiva”, diz Mariana. O ator Marcos Palmeiras tem duas propriedades de orgânicos em Teresópolis e está em trâmite para criação de duas RPPNs.
O produtor de leite João Olinto é outro exemplo. Ele tem um sítio de 15 hectares em Atibaia, sendo cerca de quatro hectares de Mata Atlântica. “Estou com a documentação, mas a RPPN não saiu por causa da morosidade do governo em vir fiscalizar”, diz. Mesmo assim, Olinto não descuida da área. “Eu não deixo ninguém caçar, nem entrar para pegar palmito, xaxim, bromélia”, diz o produtor.
Os benefícios para o proprietário de uma RPPN são: isenção de Imposto Territorial Rural (ITR), prioridade na concessão de crédito e nos programas de pagamento por serviços ambientais. Mas o dono responde por qualquer incidente na área. Por isso, ao decidir criar uma RPPN, a pessoa deve definir se a instituirá no âmbito federal, estadual ou municipal. “Se a propriedade está ao lado de uma unidade de conservação federal, que já tem policiamento ao redor, é mais fácil recorrer ao órgão federal”, diz Mariana.
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