terça-feira, 4 de junho de 2013

Reportagem - Aeromóvel estreia na Capital Gaúcha - Veículo movido a ar andou seus primeiros metros


O aeromóvel estreia na Capital Jean Schwarz/Agência RBS
Testes começaram às 19h de terça-feira na Estação Aeroporto da TrensurbFoto: Jean Schwarz / Agência RBS
Trinta e um anos depois de o governo federal abandonar o projeto, esta terça-feira foi o dia em que o aeromóvel enfim fez a sua aguardada estreia em operação experimental em Porto Alegre. O motor de vento foi acionado para movimentar o veículo pela primeira vez nos trilhos que ligam o aeroporto Salgado Filho à estação da Trensurb, descongelando uma história simbolizada pelo antigo protótipo estacionado na elevada em frente à Usina do Gasômetro.

Em vídeo, assista à primeira viagem do aeromóvel:

Visto como opção futurista de transporte no Brasil e, ao mesmo tempo, questionado, o aeromóvel nunca foi unanimidade. No entanto, arrebanha apoiadores a rodo desde 2004. Foi quando o Ministério da Ciência e Tecnologia lançou um parecer técnico que recomendava o investimento na criação do engenheiro pelotense Oskar Coester. Dois anos depois, o caos aéreo fez explodir a preocupação com a infraestrutura dos aeroportos e, a reboque, com a facilitação dos acessos a eles. Por fim, a confirmação da Copa e da Olimpíada no Brasil, em 2009, consolidou a necessidade de se investir em novos modais de transporte.
O panorama tornou-se favorável para o aeromóvel deslanchar. Atrás da linha do aeroporto da capital gaúcha, formou-se um rastro de novas ideias de projetos.
Até agora, o único lugar onde o aeromóvel vingou comercialmente foi Jacarta, capital da Indonésia. Uma linha de 3,2 quilômetros com três veículos e seis estações funciona desde 1989 no Taman Mini Indonesia Indah — um parque temático que, resumidamente, pode ser descrito como uma miniatura do país. Lá, o veículo opera às quintas-feiras, sábados e domingos, de acordo com Johannes Hutapea, funcionário da Embaixada do Brasil em Jacarta que andou no transporte há dois anos. Segundo ele e outra funcionária da representação, o aeromóvel funciona a contento.
Na Capital, o traçado será curto como em Jacarta: pouco menos de um quilômetro. As pequenas distâncias são usadas pela oposição ao meio de transporte como uma limitação. Foi assim em 1982, quando o então ministro dos Transportes, o engenheiro gaúcho Cloraldino Severo, hoje com 75 anos e consultor em sua área de atuação, freou o ímpeto de Coester. Ele optou por não investir no projeto:
— O aeromóvel não é transporte de massa. Essa ideia de uma linha até a Zona Sul, por exemplo, é uma loucura. Para se deslocar terá de aumentar o número de motores. Aumentando a capacidade, a viga ficará gigantesca. Será preciso ter escadas rolantes. O custo ficará extremamente alto.
A Trensurb é a responsável pelo renascimento do aeromóvel. De acordo com o diretor-presidente da empresa federal, Humberto Kasper, o sistema provou ter um preço de implantação quatro vezes menor do que qualquer VLT (veículo leve sobre trilhos) em elevada — de US$ 20 milhões a US$ 25 milhões o quilômetro, ante US$ 80 milhões a US$ 100 milhões do concorrente. Quanto ao custo de operação, Kasper espera que seja avaliado na prática com a linha do aeroporto, mas acredita que deverá ser inferior ao dos ônibus. Ele contesta a observação de que o aeromóvel se limitaria a curtas distâncias e ao baixo número de passageiros:
— Temos um veículo para 300 pessoas, uma capacidade superior à de um ônibus articulado. E se o aeromóvel opera em uma linha de três quilômetros, não tem por que não funcionar em distâncias maiores.
O debate sobre o aeromóvel ainda deve durar. Mas, a partir de agora, começaremos a ter as respostas.


Em vídeo, veja como funciona o veículo que anda sem motorista:



 Veículo movido a ar começa a ser "amaciado"
O sistema de R$ 37,8 milhões do aeromóvel, que ligará o terminal 2 do aeroporto Salgado Filho e a Estação Aeroporto da Trensurb começou a ser "amaciado" por volta das 19h de ontem. Esse, entre aspas, foi o termo usado por Diego Abs, o engenheiro da Aeromóvel do Brasil S.A. responsável pela obra. ZH acompanhou os primeiros movimentos do veículo com exclusividade, juntamente com outras 11 pessoas, entre elas o criador do aeromóvel, Oskar Coester, e o diretor da Trensurb, Humberto Kasper.
— O primeiro teste foi melhor do que a gente esperava. O que nos surpreendeu foi a estabilidade na curva — comemorou Coester.

 

Veículo tem capacidade para 150 passageiros

Foto: Jean Schwarz, Agência RBS


Nesta primeira fase, o veículo, com capacidade para 150 pessoas, foi comandado por joystick — o aeromóvel não tem condutor —, mas com todo o aparato das proteções automáticas. O veículo andou diversas vezes em um mesmo percurso de 450 metros, metade do trajeto total.
A previsão é de que chegue em setembro o segundo carro, com capacidade para carregar o dobro de passageiros da unidade menor. No segundo semestre o equipamento deve começar a atender ao público.
— Fizemos diversos testes isolados, energizamos os trilhos e está tudo em perfeitas condições. A partir de agora, diversos testes dinâmicos serão feitos até que esteja tudo funcionando perfeitamente — disse o engenheiro.
ENTREVISTA
Cloraldino Severo, ex-ministro dos Transportes
"Um sistema de baixa eficiência"
O engenheiro que rejeitou o projeto do aeromóvel em 1982 trabalhou no governo João Baptista Figueiredo até 1985. Hoje, atua como consultor. Ontem, rompeu o silêncio sobre o assunto e falou por telefone com ZH. Confira trechos da entrevista:
Zero Hora — O que o senhor acha da retomada do aeromóvel?

Cloraldino Severo — O que estão fazendo é o que poderiam ter feito há muitos anos. A minha posição quanto a ter um sistema ligando ao aeroporto é de que este é o papel para o qual ele serve. Quanto ao resto, é um sistema de baixa eficiência.

ZH — Não havia possibilidade alguma de aprovar o projeto do Oskar Coester?

Severo — O ministério tinha recursos, eu, como gaúcho, tinha todo o interesse, só não fiz porque hoje vocês estariam me chamando não sei de quê. Seria um desperdício de dinheiro.

ZH — Agora o aeromóvel ressurge.

Severo — Durante todos esses anos, o sistema não conseguiu se impor, a não ser em um parque. Até que (Coester) conseguiu vender o peixe aqui, aproveitando o problema da Copa.

ZH — Qual o futuro do aeromóvel, para o senhor?

Severo — É nessa questão de ligar aeroportos, por exemplo.

ZH — O senhor se animaria a acompanhar um teste do veículo?

Severo — Não me disponho a acompanhar porque acho que ele (Coester) não precisa da minha companhia. Faço votos que tenha sucesso.

ENTREVISTA
Fernando Mac Dowell Consultor, doutor em engenharia de transporte
"Não disputa com o metrô"
Ex-secretário fluminense dos Transportes, criador do projeto de aeromóvel em Nova Iguaçu (RJ) e um dos especialistas no setor mais respeitados do país, Fernando Mac Dowell falou ontem por telefone com ZH desde o Rio de Janeiro. Confira:
Zero Hora — Como foi a descoberta do aeromóvel para o senhor?

Fernando Mac Dowell — No lugar de criticar o que tinha surgido no Rio Grande do Sul, quando todo mundo saiu criticando, eu fui aprender. Mandei uma equipe para examinar e vi que o negócio tinha uma lógica.

ZH — Qual a principal vantagem?

Mac Dowell — O custo operacional baixo. Tem capacidade excelente, mas não disputa com o metrô. Pode, perfeitamente, alimentar o metrô.

ZH — O senhor estudou os modais para chegar a uma conclusão positiva sobre o aeromóvel?

Mac Dowell — Sim. Fui chamado pelo governo federal para sugerir uma solução de mobilidade ao Rio de Janeiro. Aí, analisei todas as tecnologias: BRT, aeromóvel, VLT, metrô, o monotrilho e o trem de levitação magnética. Aí, a grata surpresa foi o desempenho do aeromóvel.

ZH — O que o estudo mostrou?

Mac Dowell — O aeromóvel é mais econômico e o único ambientalmente correto porque o ar que sai é só vento. Não tem combustível, emissões veiculares, nada.

ZH — E a sugestão pelo aeromóvel foi aceita?

Mac Dowell — Gostaram para caramba. Mas, depois, politicamente, tiveram que... bom... deixa para lá.












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